segunda-feira, 1 de julho de 2013

A noite de núpcias



Por Michele Calliari Marchese

Por fim Mariana arranjou um namorado e iam casar. Por nada no mundo deixava que o Antônio lhe encostasse um dedo sequer. “É pecado.” Mal lhe beijava a face na despedida do namoro. Não sabia dessas coisas e nem das outras, aquelas da carne. Não ousava pedir para a mãe sobre o casamento por puro respeito, e a mãe de vergonha pouco lhe dizia.
O namoro durou muito, porque nesse meio tempo o Antonio satisfazia suas necessidades na casa da Dona Luiza e por lá tinha uma namoradinha fixa e assim ele ia levando as duas em banho-maria.
Os pais da Mariana resolveram por um fim naquele eterno namoro e chamaram o Antonio para que tomasse as providências para o casamento que se realizaria por bem ou por mal dali um mês, contando da data da conversa. E ao futuro noivo não sobrou outra coisa a não ser comprar as alianças e despachar a namoradinha.
Para despachar a namoradinha levou quase o tempo dos preparativos do casório, e não tinha jeito de arranjar as palavras certas para o rompimento. E disse então numa grosseria de dar dó que ela era simplesmente “a outra”, e que onde ela estava homem nenhum tiraria, tampouco ele. A outra se ofendeu, mas a Dona Luiza soube como contornar a situação e mesmo triste e abandonada a namoradinha se conformou.
A Mariana não desconfiava de nada do Antonio e muito menos de como se nasciam os filhos, ou melhor: de como se faziam os filhos. Foi com a graça da pureza e a ignorância estampada no rosto juvenil, receber o Antonio em matrimônio sem imaginar o significado de uma noite de núpcias.
A outra assistiu o casamento com lágrimas nos olhos, bem no último banco da igreja, próximo à saída. Engolia os soluços com a determinação de uma mulher que ama. Ali, tentou despedir-se em pensamento do seu Antonio, mas não conseguiu; alguma coisa lhe dizia que esperasse mais um pouco. Saiu apressada da igreja e foi ter com a Dona Luiza que decerto a confortaria mais um pouco.
O casamento acabou e a festa também.
O Antonio já estava deitado na cama dentro do seu pijama novo quando estranhou a ausência da mulher. Foi procurar e encontrou a Mariana dormindo no outro quarto. Perguntou-lhe o que fazia ali e ela respondeu que ia dormir. Ele ficou desconfiado e ainda mais quando ela se cobriu até o nariz com o lençol para que ele não a visse de camisola.
Então ele lhe disse que fosse até a cama do quarto deles para que tivessem a noite de núpcias e a Mariana começou a chorar e a pedir o que é que ele tinha em mente. Antonio sequer respondeu e não restou outra saída a não ser falar com a sogra, pois que diante da choradeira, desconfiava que a Mariana não soubesse o que tinha que fazer. A sogra ficou desolada e envergonhada lhe disse que ele voltasse para casa e ensinasse o que a Mariana precisava saber.
Voltou para casa e tentou explicar numa conversa amena, ele de pé e ela escondida sob os lençóis. Mas não teve êxito. Numa das tantas saídas dele da casa naquela noite foi que teve a ideia de chamar a namoradinha, para que ela explicasse para a mulher as coisas do céu e da terra que aconteciam na noite de núpcias.
Oras, quando a namoradinha escutou tamanho absurdo, no início se sentiu a última pessoa que poderia existir na face da terra, mas depois, ponderadamente e analiticamente resolveu que sim, que iria conceder mais esse desejo ao amante.
Foi escondida sob um guarda-chuva debaixo de uma lua cheia e sem nuvens. Era estranho aquilo, mas como era madrugada, ninguém deu conta do ocorrido.
Chegando a casa, o Antonio fez as apresentações e a agora “prima” trancou-se no quarto com a esposa. Ficaram tanto tempo que o marido teve que bater na porta porque já ia tarde alta.
A Mariana se sentiu segura na presença da outra e pediu permissão ao marido que a acolhesse por uma semana e que ao cabo do aprendizado ela teria com ele a Noite de Núpcias. A namoradinha adorou a ideia, porque depois da escolarização passava o restante da noite com o Antonio e como a Mariana era uma pessoa muito pudica e confiante não desconfiava de nada.
Quando aquela semana terminou, uma Mariana despojada e mais feliz anunciou o fim do casamento nunca consumado e quando o Antonio pediu o porquê, nem precisou ouvir a resposta, pois que a namoradinha também estava de partida.




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6 comentários:

  1. O feitiço virou contra o feiticeiro! hahaha!

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  2. Final inesperado! Gostei muito de seu conto! Isso acontecia muito nos casamentos de antigamente. Até escrevi um causo contando um fato real. Um abraço.

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  3. A primeira parte do conto é que acontecia antigamente, o final nem tanto...Eu acho. Rsrsrsrs

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  4. É verdade Maria Mineira, muito comum e costumeiro a tal prática, assegurada pela política de quem quem manda naquele tipo de sociedade, no entanto a Michele surpreendeu com o final já com gosto de sociedade moderna... coisa de autor, a surpresa é fundamental. Beleza Michele, um abraço.

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  5. Pessoal, muito obrigada pelas palavras! Beijão

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  6. Sou muito suspeita para falar dos seus causos, pois sou sua fã declarada. E que este é um daqueles contos vigaristas de primeira, disso você já sabe. Parabéns, Comadre, fiquei até com pena do marido abandonado (só faltou ele se afogar nas próprias lágrimas perguntando-se 'por quê', como o bígamo naufragado morreu gritando 'me deixe entrar!' Abraços!

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